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quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Quando uma criança é arrastada até a morte por bandidos, encenando o horror no meio da rua trafegada por carros blindados, logo comparece nos discursos cegos de paixão a famigerada pena de morte, como se sua inclusão num hipotético novo Código Penal fosse instituir o que já é instituído, com consentimento de todos os que se sabem isentos dela - as classes privilegiadas do país. Não é fácil precisar até que ponto essas concepções autoritárias são pura ingenuidade dos que ignoram qualquer conhecimento humanístico, ou sentimento atávico de quem perdeu o chicote mas não a vontade de açoitar.

Os brasileiros "bem-nascidos", cansados da miséria que criaram, deixam, à senda aberta, correrem firulas ideológicas de progresso cívico e, sem perceberem (ou será que percebem?), preconizam retrocessos civilizacionais, clamando ao Estado que lhes sirva mais do que tem servido, mais que lhes dando impunidade e chacinando o subproduto do modelo social de que são beneficiários. Apesar das masturbações cerebrais do pensamento médio pragmático, de nada adianta matar indivíduos marginais (na acepção mais integral do termo "marginal") cujo comportamento resulta de um padrão cristalizado de sociedade. Alguns dirão: Mas a pena de morte constituir-se-á uma medida curativa, urgente, sendo que, à medida que a sociedade evoluísse, dela precisaríamos cada vez menos, até ser extinta.

Mas, pergunto: como o país evoluiria sem sanar o mal fundador de todos os seus problemas graves - a desigualdade social? Como um país que tem apenas 5% da sua população com renda acima de R$800,00 (fonte: ONU) espera resolver questões derivadas dessa concentração? Uma parte dos brasileiros, que considera aceitável a tortura de favelados inocentes para fins de "investigação", sabe que nunca será vítima dela; outra parte, de camadas mais pobres, que também a legitima, o faz embalada pela pedagogia da "grande imprensa", e revolta-se com Suzane Hichtoffen, mas não vê o vizinho ser violentado e morrer na mesma rua em que mora (naturalizam o próprio descalabro).

Toda uma população em frangalhos, alienada na própria condição de quase gente, de Norte a Sul do país, está muito bem domesticada pela eficácia da televisão, sabe claramente o seu lugar. Agora, já que não se suicida, e fica só parindo natos traficantes, pois já lhe ensinaram que estes são - e não se tornam - delinqüentes, é só pedir às inertes autoridades a própria pena capital, para que, enfim, o Brasil de alguns possa seguir em paz na sua caminhada rumo ao futuro que nunca souberam planejar.
(Alex)

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